quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

PORQUE A BOLA BATE NA TRAVE - Por ELOI ZANETTI

 

Nada mais frustrante para jogadores e torcidas, principalmente em jogos onde o time precisa e, muito, de gols, ver a bola, sistematicamente, bater na trave. Parece que quanto maior a necessidade de gols mais a bola teima em bater na trave. Fosse o espaço alguns centímetros mais largo talvez este fenômeno não acontecesse com tanta freqüência. Tenho a impressão de que o comitê que calculou as medidas oficiais das traves, 7,32 X 2,44 + 0,12 metros, as estipulou pensando que naquele tamanho as probabilidades da bola bater na trave seriam maiores e assim os jogos teriam mais emoção. Possibilidades dolorosas para quem ataca e de alívio para quem defende. A estatística sobre os ataques do meu time confirma que sempre que precisamos ganhar para melhorar ou garantir boa classificação, as bolas batem no travessão. Incompetência nossa ou sorte do outro time?

A batida de bola na trave é o instrumento de tortura em massa mais eficiente que o homem já inventou – nem a Inquisição Espanhola, nem os torturadores chineses poderiam ter pensado em forma tão cruel de suplício. Precisando, desesperadamente de um golzinho e a bola teimar em não entrar por puro capricho das leis da estatística. Os fatores aleatórios que ditam o encontro de um corpo que se desloca em alta velocidade – a bola – ao bater em um obstáculo – o travessão – já provocaram o infarto de muita gente. Morreu do quê? – De bola na trave.

Tragédias para serem completas precisam ser imprevisíveis, por isso saber o final de uma história com antecedência tira-nos o gosto da narrativa e uma partida de futebol nada mais é do que a contação de uma bela história. Por isso, as incertezas da sorte e do azar, o desvio da bola, o gol quase feito ou no último minuto, ao apagar das luzes fazem do futebol um esporte tão arrebatador e apaixonante.

A impotência humana frente a essas forças desconhecidas, que num instante podem anular tudo aquilo pelo qual tanto nos empenhamos: estratégias perfeitas, treinos e preparações extenuantes, deixam-nos desarmados e perplexos, pois as leis da lógica e as da causa e do efeito se desmancham no ar. Na vida e no futebol nem sempre ganha o mais técnico e preparado. Jogos, classificações e carreiras são decididas pela aleatoriedade das bolas batidas na trave. Frente ao imprevisível, vamos buscar apoio na superstição, nas rezas e nas fórmulas mágicas das promessas para os santos. Depois das encruzilhadas o lugar onde se faz mais macumba é a pequena área do campo de futebol. São Jorge proteja nosso time!

O contra-senso é ter que aceitar a existência de bolas na trave mais bonitas do que gols: há aquela que bate com força e espirra para o lado, quando o atacante vê o empenho do seu trabalho se perder e, instantaneamente, leva as mãos em concha para o rosto lastimando o gol perdido, quase sempre com o movimento labial de um palavrão. Tem aquela que bate por dentro da baliza, espirra no chão – fora da linha de gol -, volta a bater na trave e vai mansinha para a mão do goleiro. E existem aquelas que passam tão rente que o povo diz: “passou tirando tinta.”

Fora dos gramados também existem bolas na trave, é quando nossos projetos, sonhos e negócios pifam. Instala-se a decepção e a lamúria e ficamos lastimando a falta de sorte que pode ter sido construída de forma inconsciente por nós mesmos, pois movidos por sentimentos ocultos, como a culpa e o medo do sucesso, auto-sabotamos nossos sonhos sem darmos conta do ato. Ao fugir das cobranças de pênaltis perdemos as oportunidades dos gols.

Das dezenas de estratégias empresariais que li, em nenhuma delas vi o tema “o imprevisível” ser estudado em profundidade. Ao fazer planos, não costumamos pensar no aleatório. César, aquele que se tornou o todo poderoso do Império Romano, se preocupou com isso. Ao atravessar com suas tropas o Rio Rubicão proclamou: “Alea jact est” – isto é, “Os dados estão lançados.” A bola poderia ter batido na trave e hoje nem saberíamos quem foi Júlio César.
ELOI ZANETTI é AMIGO DO PARQUE BARIGUI, Consultor e palestrante em marketing, comunicação corporativa e vendas.
Foi diretor de comunicação do Bamerindus (1979 a 1989).
Criador das campanhas O Tempo Passa o Tempo Voa…, Gente que Faz, o Banco da Nossa Terra, entre outras. Na ocasião inovou também a comunicação interna do Banco. Premiado dezenas de vezes.
Foi diretor de marketing de O Boticário (1989 a 2000).
Idealizador da linha de comunicação da empresa. Pioneira no marketing de relacionamento no Brasil. Primeira empresa aimplantar ouvidoria e uma das primeiras em CRMs. Criador do conceito e da implantação da Fundação Boticário de Proteção a Natureza. Estabeleceu os padrões de comunicação da empresa, levando-a a ocupar uma das mais cobiçadas posições de marca no país.
Em comunicação, trabalhou também em jornais, rádios, TVs, estúdios de produção, direção de arte, filmes publicitários e documentários. Atualmente tem seu próprio escritório de consultoria e divide seu tempo entre atender clientes, organizar workshop e fóruns sobre vendas, comunicação e criatividade, proferir palestras e escrever livros.
Colunista, com artigos publicados sobre comunicação, marketing e comportamento em diversas revistas e jornais do Brasil. Seus artigos são utilizados por centenas de professores de marketing e comunicação em todo o Brasil.
Ambientalista, foi presidente do Conselho da SPVS – Sociedade para a Preservação da Vida Selvagem, é conselheiro da TNC – The Nature Conservancy, para o Brasil. (ambas especializadas em comprar florestas para conservação) e da Universidade Livre do Meio Ambiente (Curitiba).
Fundador da Casa do Contador de Historias (Curitiba).
Responsável pelo Prêmio Aberje Sul. Instituição que congrega mais de 700 grandes empresas do Brasil na área da comunicação.

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